Ninguém se atreve, ainda, a projetar um futuro desastroso para os mercados de matérias-primas, mas se os preços voltassem aos patamares de 2003, quando já havia começado a escalada de cotações que deu origem ao boom das commodities, o Brasil perderia pouco mais de US$ 11 bilhões em receita de exportações, cifra equivalente a nada menos do que 2,17% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro.
O boom das commodities, que já pode ter chegado ao fim se o nervosismo nos mercados internacionais conta para algo, ajudou o Brasil a ter um saldo 17% maior do que o que teria hoje caso os preços não
Ninguém se atreve, ainda, a projetar um futuro desastroso para os mercados de matérias-primas, mas se os preços voltassem aos patamares de 2003, quando já havia começado a escalada de cotações que deu origem ao boom das commodities, o Brasil perderia pouco mais de US$ 11 bilhões em receita de exportações, cifra equivalente a nada menos do que 2,17% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro.
O boom das commodities, que já pode ter chegado ao fim se o nervosismo nos mercados internacionais conta para algo, ajudou o Brasil a ter um saldo 17% maior do que o que teria hoje caso os preços não tivessem disparado a partir de 2002.
Os cálculos, feitos pela Folha, assumem a hipótese de que o Brasil exportaria, em média, a mesma quantidade de produtos que exportou no primeiro semestre deste ano, mas a preços de 2003.
Hipótese que pode não se concretizar no caso de um recuo forte nas cotações, mas que dá uma idéia da importância das exportações de matérias-primas para a economia brasileira.
No primeiro semestre deste ano, as receitas com vendas externas de commodities responderam por 40,9% das receitas totais de exportação do Brasil -ou aproximadamente 5,9% do PIB brasileiro. No mesmo período de 2003, essa proporção era de 38,8%.
Comparadas com as exportações dos seis primeiros meses de 2003, as vendas externas do primeiro trimestre deste ano cresceram 91%. Quase um terço desse crescimento é explicado apenas pelo aumento dos preços das commodities.
Médias
Desde 2002 até julho deste ano, estima o FMI (Fundo Monetário Internacional), os preços das commodities metálicas subiram nada menos do que 180%. Já alimentos e outras matérias-primas registraram altas de 20% e 4%, respectivamente.
As médias, claro, escondem desempenhos muito diversos. Os alimentos exportados pelo Brasil, por exemplo, registraram altas mais significativas que os 4% apurados pelo FMI. Os dados do Ministério do Desenvolvimento mostram que o preço médio do café exportado pelo Brasil subiu 96% entre os primeiros semestres de 2003 e 2006. A carne (alta de 38%) e o açúcar (alta de 15%) também tiveram valorizações maiores do que a média.
Por enquanto, não há sinais claros de que o novo cenário da economia mundial será de preços cadentes para esses produtos. Quem tenta hoje prever o que ocorrerá com as cotações, olha para a China e para os Estados Unidos.
A China tornou-se a grande consumidora mundial de matérias-primas. As compras chinesas explicam metade do crescimento do consumo mundial de alumínio, cobre e aço entre 2002 e 2005.
Crescimento que não foi tímido, já que o consumo das três commodities registrou, em média, taxas de crescimento anuais robustas: de 3,8% no caso do cobre, de 7,6% no do alumínio e de 9,2% no do aço.
No mesmo período, ou seja, entre 2002 e 2005, foi praticamente só por causa dos chineses que cresceu a procura mundial por produtos como chumbo, níquel, estanho e zinco.
Mistério chinês
Assim, só se arrisca a prever o que ocorrerá com o preço das commodities quem já se arriscou pelo terreno das previsões a respeito da economia chinesa: ela vai crescer menos? O quanto menos?
No caso dos EUA, a preocupação, para quem quer saber o que vai acontecer não só com as commodities mas com a economia mundial, é saber quando acabará o período de maior prosperidade da economia norte-americana. Mais: é saber se ele acabará em um pouso suave, o “soft landing” dos economistas, ou em um desastre recessivo, o “hard landing”.
China anda bem e pouso suave nos EUA é sinal de crescimento menor do mundo e recuo não preocupante nos preços das commodities. “Hard landing” e problemas na China correspondem ao cenário desastroso para os exportadores de matérias-primas.
Por enquanto, o ciclo de alta das cotações dos produtos básicos, junto com a discussão sobre seus preços, conseguiu ressuscitar um antigo debate. Os países que os exportam estão condenados a viver com as incertezas, oscilações e humores dos mercados.
Flutuações
É verdade que o preço de todos os produtos flutuam, mas, mostra levantamento do Fundo Monetário Internacional, as flutuações tendem a ser mais aleatórias e acentuadas no caso das commodities, especialmente das agrícolas.
Foi justamente o fato de os preços tenderem à montanha-russa que levou os economistas a advogar que a única saída do subdesenvolvimento era a industrialização. Da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina), saiu a tese de que os exportadores de matérias-primas estavam condenados ao que os economistas então chamaram de deterioração dos termos de troca: os preços desses produtos tendem a uma queda secular, ainda que subam e desçam no curto e médio prazo, dizia Raúl Prebisch nos anos 50.
Trocando em miúdos, era preciso exportar cada vez mais para obter, em troca, a mesma quantidade de produtos cada vez mais caros. O poder de compra das exportações dos países exportadores de commodities, previa, tendia sempre piorar. José Antonio Ocampo, secretário-executivo da Cepal, estimou que, entre 1900 e 2000, as matérias-primas se deram mal.
Tropeços
“É um fato que o preço relativo das matérias-primas se deteriorou marcadamente durante o século 20”, escreve o economista em trabalho publicado pela Cepal.
Os investidores tentam agora saber o que ocorrerá no século 21. Para alguns, a entrada de gigantes como China, Índia e Rússia no mercado mundial mudaram radicalmente as condições de procura, o que pode manter os preços altos por um bom tempo ainda, mesmo que eles recuem um pouco.
As últimas semanas foram de tropeços. Os preços das matérias-primas, petróleo incluso, caíram sem parar desde a primeira semana de setembro. Desde maio, quando o índice de commodities CRB, o mais popular no mercado financeiro, atingiu seu pico, eles já recuaram nada menos que 17%.