A tributação excessiva do setor de serviços (Jornal do Commercio, 28/10/2003)

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Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo


No conjunto das atividades econômicas, o setor de serviços ocupa, segundo dados do IBGE, posição ímpar, seja quanto ao número de empresas existentes – 1.739.956 -, seja quanto ao volume dos trabalhadores ocupados – 17.013.302 -, beneficiando cerca de 60 milhões de pessoas. Logo, as ações governamentais para a redução das desigualdades sociais, taxa de desemprego e pobreza têm de prestigiar o setor de serviços.

Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo


No conjunto das atividades econômicas, o setor de serviços ocupa, segundo dados do IBGE, posição ímpar, seja quanto ao número de empresas existentes – 1.739.956 -, seja quanto ao volume dos trabalhadores ocupados – 17.013.302 -, beneficiando cerca de 60 milhões de pessoas. Logo, as ações governamentais para a redução das desigualdades sociais, taxa de desemprego e pobreza têm de prestigiar o setor de serviços. Em sua maior parte, as empresas do setor de serviços são classificadas como microempresas ou empresas de pequeno porte, representando fator relevante para o crescimento da atividade empresarial e o aumento da renda nacional. Por isso, a Constituição de 1988 incluiu, entre os princípios básicos da ordem econômica, o “tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede e administração no País”, estabelecendo que “a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei” (arts. 170, IX, e 179). O Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte (Lei no 9.841, de 5/10/99) regula o tratamento jurídico favorecido a tais empresas, complementado, no campo tributário, pela criação do Simples (Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte), que facultou o pagamento mensal unificado do IR/PJ, IPI, CSLL, Cofins, Contribuição ao PIS/Pasep e Contribuições Previdenciárias.


No entanto, a Lei no 9.317, de 5/12/96, vedou – sem base constitucional – a inscrição no Simples de diversos tipos de empresas, como as prestadoras de serviços profissionais de advogado, arquiteto, engenheiro, contador, economista, administrador, jornalista, médico, publicitário e outros, de serviços de limpeza, vigilância e conservação, de locação de mão-de-obra, as administradoras de imóveis, as empresas de propaganda e publicidade etc. Todas essas empresas vêm batalhando para a correção desse tratamento, que ofende o princípio constitucional de igualdade “entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente” e viola a proibição de “qualquer distinção em razão da ocupação profissional ou função por eles exercida” (Constituição, art. 150, II). Desde o governo anterior, o Fisco vem adotando uma série de medidas para elevar a carga tributária sobre as empresas prestadoras de serviços. A Lei Complementar no 116, de 31/7/02, incluiu, na nova lista para a incidência do Imposto (municipal) sobre Serviços (ISS), numerosos serviços que não eram tributados. Na contramão da ação do governo para reduzir as desigualdades sociais, a lei mantém a incidência sobre a educação e o ensino, inclusive a pré-escola e o ensino fundamental, e os serviços de saúde e assistência médica e passa a tributar os serviços de assistência social e os bancos de sangue. A Lei no 10.637, de 30/12/02, que eliminou a cumulatividade da Contribuição ao PIS/PASEP, criou novas obrigações burocráticas, exigindo escrituração específica, a fim de permitir a dedução, na base de cálculo, das parcelas admitidas pela lei. A nova escrituração soma-se às relativas ao IR, IPI, CSLL, ICMS e contribuições previdenciárias. A alíquota da Contribuição foi aumentada em 153% (de 0,65% para 1,65%), admitidas algumas deduções (mercadorias para revenda, insumos etc.) para chegar-se à base de cálculo, mas as prestadoras de serviços, sobretudo as que empregam farta mão-de-obra, pouco têm a deduzir e a nova alíquota incide sobre a receita bruta. A Lei no 10.684, de 30/5/03, que criou o “Refis II”, prescreveu um absurdo aumento de 50% nas alíquotas do Simples, para as empresas prestadoras de serviços de ensino fundamental, formação de condutores de veículos terrestres, agências lotéricas e agências terceirizadas de correios, bem assim para as empresas, incluídas naquele regime fiscal que tiverem, pelo menos, 30% da receita proveniente da prestação de serviços.


Recentemente, a Secretaria da Receita Federal resolveu excluir do Simples cerca de 80.000 empresas, mas sem prévia notificação ou auto de infração de exigência do crédito tributário, com afronta ao princípio do contraditório e ampla defesa, um dos direitos e garantias fundamentais assegurados pela Constituição (art. 5º, LV), e às normas específicas do processo administrativo fiscal (art. 9o). Se a Receita Federal não reexaminar tal decisão, milhares de empresas serão forçadas a ingressar em juízo, contra a União, abarrotando a Justiça Federal. Por fim, a proposta de reforma tributária em votação no Senado transfere, da folha de salários para a receita ou faturamento, a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal, inviabilizando as empresas que possuem poucos empregados, como as sociedades de advogados, as empresas de consultoria, de contabilidade, de artistas etc. A imensa classe do comércio de serviços espera que o Governo modifique a legislação supracitada e o Senado altere a PEC da reforma tributária, sob pena da inviabilização de centenas de milhares de empresas prestadoras de serviços, com o aumento da taxa de desemprego e das desigualdades sociais.


Publicado no Jornal do Commercio de 28/10/2003, Caderno Opinião, pág. A-17.

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