Antonio Oliveira Santos
Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo
No momento em que o Congresso Nacional discute os últimos acertos políticos para ultimar a reforma do sistema de aposentadoria na área estatal, vale a pena passar em revista as reformas recentemente realizadas, ou ainda em curso, em outros países.
Todas têm um traço comum: a impossibilidade da população economicamente ativa de hoje garantir as aposentadorias dos economicamente ativos de ontem, sem incorrer em crescente e explosivo desequilíbrio financeiro.
Antonio Oliveira Santos
Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo
No momento em que o Congresso Nacional discute os últimos acertos políticos para ultimar a reforma do sistema de aposentadoria na área estatal, vale a pena passar em revista as reformas recentemente realizadas, ou ainda em curso, em outros países.
Todas têm um traço comum: a impossibilidade da população economicamente ativa de hoje garantir as aposentadorias dos economicamente ativos de ontem, sem incorrer em crescente e explosivo desequilíbrio financeiro. E o cerne de tudo reside no determinismo demográfico e na fixação da idade para aposentadoria.
Embora o Brasil já tenha entrado na fase denominada de transição demográfica, na qual, na média, cada casal tem dois filhos, a mudança na composição da população por faixas de idade é muito mais nítida em países europeus. No Velho Continente, a esperança de vida aumentou extraordinariamente, a partir da segunda metade do século XX, e a fertilidade baixou a partir da década dos anos 1970. A conseqüência dessa mudança de perfil populacional foi óbvia. Os pilares do generoso sistema de pensões europeu começaram a ruir.
Ainda que o cerne da questão seja o mesmo, as tentativas de solução diferem entre um país e outro. Áustria, Espanha e Grécia buscam unificar os regimes de aposentadoria pública e privada. Finlândia e Suécia aumentaram a idade para o direito à aposentadoria. Alemanha e Itália tratam de desestimular a aposentadoria precoce. Vários são os exemplos nos quais as reformas demandam aumento das contribuições.
Mas há sempre uma constante a explicar a tibieza dos governos, diante de um problema cuja solução não admite o status quo. Mudanças no sistema de pensões, quaisquer que sejam, são extremamente impopulares entre eleitores e trabalhadores. Em diversas ocasiões, tomando como exemplo França e Itália, as centrais sindicais paralisaram o país, ao menor sinal de tentativa de mudança nas pensões.
A reforma na França se assemelha à reforma brasileira, em tramitação no Congresso, porque diz respeito ao funcionalismo público. A essência da reforma requer que os funcionários permaneçam em atividade por mais dois anos e meio para fazer jus à pensão plena, prevendo aumento das contribuições em 2008. Em seu proselitismo em prol da reforma, o primeiro-ministro Jean Pierre Raffarin sublinhou que o sistema de pensões imaginado há cinqüenta anos estava em desacordo com a realidade demográfica do país, em que a relação trabalhador ativo/pensionista, em quarenta anos, tinha caído de 4:1 para 2:1 e passaria a 1:1 em 2020; e que, em nada se fazendo, nesse espaço de 20 anos o valor real das pensões estaria reduzido à metade do valor atual.
De um modo geral, nas organizações internacionais a aposentadoria corresponde a 80% do maior salário, quando em serviço ativo. A idade mínima ainda é de 55 anos combinados com 30 anos de serviço. Fora dessas duas condições, a antecipação da aposentadoria tem uma redução proporcional, na qual se combina o tempo a menor com diminuição do valor do benefício.
Em qualquer caso, para o Estado Nação, a constante é a mudança radical da pirâmide das idades e a impossibilidade financeira de manter, para o futuro, as regras estabelecidas no passado.
Voltando ao caso brasileiro, não há dúvida que para o Sistema Geral, a introdução do “fator previdenciário” foi um avanço. Desestimula a aposentadoria precoce e, alcançada a idade limite, premia a permanência em atividade. O que está neste momento em causa, na verdade, é a questão das aposentadorias dos servidores públicos. Não será preciso consultar a cartomante para antecipar que em ambos casos, público e privado, a tendência será a de amalgamar uma pensão básica à pensão resultante de contribuição para complementação dessa aposentadoria. Contribuição que, paulatinamente, pode se constituir em fonte de poupança institucional e alavanca do desenvolvimento.
Finalmente, para enfatizar a questão demográfica, vale a pena dar uma olhadela nas previsões do IBGE, segundo as quais, um indivíduo que tenha completado 60 anos, hoje, terá uma probabilidade de sobrevida de mais de 16 anos, se for homem e cerca de 20 anos, se mulher.
Estes dados, que mais do que dados são fatos, prenunciam que as reformas que estamos discutindo, em poucos anos mais, terão que ser revistas e refeitas. O próprio conceito de aposentadoria terá de ser reformulado, quem sabe numa combinação equilibrada de ócio e ocupação.
O importante é dar a este assunto a importância que ele tem.
Publicado no Jornal do Brasil de 30/10/2003, Caderno Opinião, pág. A-13.