Uma lei infeliz (Jornal do Commercio, 11/04/2002)

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Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo


O Governo do Estado do Rio de Janeiro, em uma iniciativa infeliz, sancionou demagógica lei aprovada pela Assembléia Legislativa, obrigando as farmácias e drogarias a concederem 30% de desconto na venda de medicamentos aos consumidores com mais de 60 anos.


A Confederação Nacional do Comércio, no uso da competência que lhe confere a Constituição Federal, ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade (ADIN), no Supremo Tribunal Federal, cujo presidente, o ilustre Mi

Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo


O Governo do Estado do Rio de Janeiro, em uma iniciativa infeliz, sancionou demagógica lei aprovada pela Assembléia Legislativa, obrigando as farmácias e drogarias a concederem 30% de desconto na venda de medicamentos aos consumidores com mais de 60 anos.


A Confederação Nacional do Comércio, no uso da competência que lhe confere a Constituição Federal, ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade (ADIN), no Supremo Tribunal Federal, cujo presidente, o ilustre Ministro Marco Aurélio de Mello, concedeu medida liminar, a qual, no entanto, não foi mantida pelo plenário daquela Corte.


O absurdo da lei começa pela adoção do critério da “idade”, como fundamento econômico para a concessão filantrópica, sem levar em conta o fato elementar de que existem idosos cuja renda não necessita desse falso incentivo, assim como a existência de crianças pobres, deficientes e desempregados, cujo estado de necessidade é muito mais carente do amparo governamental.


Configura-se, no caso, uma lamentável, equivocada e improdutiva intervenção do Estado no domínio econômico, matéria interditada pela Constituição Federal. Lamentável, porque inconstitucional. Equivocada e improdutiva porque significa impor a uma classe empresarial da iniciativa privada um ostensivo prejuízo. Senão, vejamos: as farmácias e drogarias trabalham com margem padrão de 24%, de modo que um medicamento adquirido por R$ 7,60 não é vendido por mais de R$ 10. Ao obrigar o desconto de 30%, o legislador e o Governador apenas exigiram que essas empresas vendam esse mesmo produto por R$ 7,00 !? Ou seja: a lei impôs, compulsoriamente, à livre iniciativa um preço predatório.


Por um princípio de elementar bom senso, é evidente que o Governo do Estado deveria buscar outros meios para atingir os objetivos visados. Lamentavelmente, porém, aconteceu que o exemplo frutificou e, possivelmente pelas mesmas razões políticas, foi repetido pela Câmara dos Vereadores da Cidade do Rio de Janeiro, agora com requintes ditatoriais de “cassar o alvará” das farmácias e drogarias que descumprirem a malfadada lei. Nem a União tem competência para tal, cabendo-lhe apenas, segundo a Lei nº 9782/99, normatizar, controlar e fiscalizar produtos… de interesse para a saúde.


A Constituição Federal prevê a intervenção do Estado em duas formas: direta, quando o próprio Poder Público exerce, como empresário, a atividade econômica, e indireta quando exerce as funções de fiscalização, incentivo e planejamento. Ora, nenhuma dessas condições ocorre no caso da absurda “lei dos 30%”, nem no âmbito estadual, nem no municipal. Trata-se, portanto, de evidente provocação, inconstitucional e arbitrária, distanciada do interesse coletivo, sob a falsa aparência de proteção à velhice desamparada. Desamparados, pelo visto, são aqueles que exercem o poder legislativo sem conhecimento dos princípios e fundamentos que justificam a razão de ser do Estado. Será que o Governo do Estado e o do Município estão pensando em atrair empresários e investimentos, com leis como essa?


Não seria muito mais lógico que o Estado buscasse uma forma de reduzir, nos limites propostos, a tributação que incide sobre os medicamentos adquiridos pelos consumidores de mais de 60 anos? Aqui fica esta sugestão, para a oportunidade de um rápido retorno ao reino do bom senso.


Publicado no Jornal do Commercio de 11/04/2002, Caderno Perspectivas, pág. A-24.

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