CBCEX debate rumo do comércio exterior em cenário global instável

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Reunião da Câmara Brasileira do Comércio Exterior avalia choque protecionista dos EUA, impactos no Brasil e avanços legislativos em tramitação

A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) sediou, no dia 30 de abril de 2025, no Rio de Janeiro, a primeira reunião do ano da Câmara Brasileira do Comércio Exterior (CBCEX). Em meio às tensões do comércio global, os participantes debateram as consequências das novas medidas protecionistas adotadas pelos Estados Unidos e o reposicionamento estratégico necessário ao Brasil. 

Na abertura do encontro, o coordenador da CBCEX, Rubens Medrano, destacou que apenas dois dos dez principais produtos exportados pelos EUA ao Brasil sofrem taxação, o que demonstra uma assimetria preocupante. A corrente de comércio tem sido superavitária aos americanos. Portanto, não justifica a alíquota adicional de 10% imposta ao Brasil.  

O governo brasileiro tem mantido diálogo com os EUA, no sentido de encontrarem uma solução para o problema. Ele alertou para possíveis distorções de mercado que possam ocorrer por causa do desvio de comércio que possa vir a ser praticado por terceiros países que perderam volumes de exportações ao mercado americano. 

“Ao mesmo tempo que se faz necessária a proteção aos nossos mercados contra esse tipo de ameaça, temos que   buscar novos destinos para nossas exportações.” 

Medrano enfatizou que o Brasil precisa reagir com planejamento estratégico.  “Ficamos fechados por muito tempo. A competitividade do agronegócio em grãos e proteínas é grande, mas nossa indústria ainda não tem escala ou sofisticação tecnológica para competir globalmente.” 

Confira as fotos da reunião aqui.

Cenário brasileiro x cenário norte-americano

Durante a reunião, o economista da Diretoria de Economia e Inovação da CNC (DEIN) Guilherme Cardoso discutiu o reposicionamento dos EUA no comércio global.

Segundo a apresentação compartilhada no encontro, as ações de Donald Trump representam uma ruptura com a lógica multilateral e podem afetar diretamente países com baixa diversificação de parceiros comerciais, como o Brasil.

Entre os destaques da análise, foram tratados a volta do protecionismo norte-americano, que compromete o sistema de regras estabelecido pela OMC; o risco de fragmentação do comércio mundial em blocos de influência geopolítica; e que o Brasil permanece vulnerável por depender fortemente de commodities e de mercados concentrados, como China e EUA.

Cardoso alertou ainda para o fato de que, embora o governo norte-americano argumente que as tarifas visam reduzir seu déficit comercial (hoje perto de US$ 1 trilhão), as medidas não se mostram sustentáveis no médio prazo.

O economista comparou, ainda, os indicadores econômicos e comerciais entre Brasil e Estados Unidos. Os dados reforçam questões estruturais como:

– A corrente de comércio brasileira representa apenas 1% do total mundial, com baixa participação de bens industrializados;

– A taxa de abertura comercial do Brasil segue entre as mais baixas entre países emergentes;

– A desvalorização cambial, embora possa beneficiar o setor primário exportador, compromete a viabilidade de negócios que dependem de insumos importados.

EUA miram setores estratégicos do Brasil

Outra exposição, feita pelo representante da Fecomércio-AP, Mychael Keverson em conjunto com a Dein, abordou a movimentação de grandes corporações norte-americanas que solicitam ao governo Trump acesso privilegiado ao mercado brasileiro nos setores de saúde, telecomunicações e etanol. 

A análise expôs riscos regulatórios e de soberania econômica como: setores como saúde e telecomunicações têm impacto direto na infraestrutura e no bem-estar da população; e o etanol que, por sua vez, é estratégico para a matriz energética e enfrenta forte competição global. 

A recomendação foi que o Brasil reforce seus mecanismos de defesa comercial e regulatória, garantindo reciprocidade em acordos bilaterais. 

Projetos em debate no Congresso

A assessora da Diretoria de Relações Institucionais da CNC (DRI) Jenifer Freitas apresentou quatro projetos de lei com impacto direto no comércio exterior.  A apresentação detalhou os seguintes textos legislativos:  

– PL nº 4.423/2024 – Estabelece normas gerais sobre o comércio exterior de mercadorias, visando consolidar a legislação e reduzir a complexidade normativa. O projeto busca: uniformizar procedimentos aduaneiros; estimular maior integração com cadeias globais de valor; e reforçar a previsibilidade jurídica para operadores de comércio exterior.  

– PLP nº 353/2017 – Institui o programa ax Free para devolução de tributos a turistas estrangeiros. Abrange: Cofins, PIS/Pasep, IPI e ICMS; estímulo ao turismo de compras; e equiparação com países que já adotam sistemas similares, como membros da União Europeia. A assessora reforçou que a iniciativa do tax free foi incluída no âmbito da reforma tributária por meio de articulação da CNC. 

– PL nº 15/2024 – Cria programas de conformidade tributária e aduaneira na Receita Federal. Também trata da figura do devedor contumaz e das condições para fruição de benefícios fiscais. A iniciativa visa recompensar o bom pagador; reforçar o combate à sonegação; e estimular o ambiente de negócios.  

– PL nº 6.406/2019 – Atualiza sanções e penalidades aplicadas ao comércio exterior, alterando marcos legais antigos. O objetivo é modernizar regras sancionatórias; estimular a concorrência leal; e eliminar normas obsoletas, como a revogação da Lei nº 2.770/1956. 

Carnê ATA

Também foi apresentada pelos representantes da Federação Nacional dos Despachantes Aduaneiros (Feaduaneiros) uma exposição sobre o Carnê ATA, documento internacional de admissão temporária de bens.  

Os principais pontos discutidos foram a ausência de legislação clara no Brasil; as dificuldades operacionais em aeroportos e portos; a falta de coordenação entre órgãos como Receita Federal, Polícia Federal e MAPA; e a necessidade de atuação normativa conjunta para eliminar barreiras e facilitar feiras, eventos e exposições internacionais.

O coordenador da CBCEX, Rubens Medrano, ressaltou que o momento exige vigilância e articulação contínua entre setor privado e governo. “Não há clareza sobre os próximos passos da política americana, nem sobre como a China vai reagir. Mas o Brasil precisa se posicionar com inteligência e agilidade.” 

A CNC continuará acompanhando os desdobramentos internacionais e atuando no Congresso e no Executivo para garantir um ambiente de negócios mais competitivo e menos vulnerável a choques externos.

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