*Jose Carlos Cirilo é diretor-geral interino do Departamento Nacional do Sesc
Acabar com a fome e a má-nutrição até 2030 é um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) criados pela Organização das Nações Unidas (ONU). A ideia é garantir que todas as pessoas, em especial as crianças, tenham acesso a alimentos nutritivos e uma vida de qualidade. A oito anos desta data limite, nos deparamos com o registro de uma taxa de insegurança alimentar no país maior que a média global, de 35%.
Segundo dados do Instituto Gallup, no Brasil esta taxa saltou de 17% em 2014 para 36% no final de 2021, patamar recorde. O levantamento constatou que 45% dos entrevistados atingidos pela fome durante 2021 tinham idades entre 30 e 49 anos. Mais recentemente, um levantamento realizado entre novembro de 2021 e abril de 2022 pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar indicou 33,1 milhões de pessoas sem ter o que comer diariamente e mais da metade da população em situação de insegurança alimentar, ou seja, sem acesso regular e permanente a alimentos.
Lutar contra esta realidade tem caráter de urgência e é preciso que toda a sociedade esteja engajada. Se por um lado a pandemia de Covid-19 contribuiu com o triste legado do aumento da fome, por outro mostrou o quanto podemos ser solidários em momentos de crise. Prova disso são os resultados registrados pelo Mesa Brasil Sesc, rede nacional de bancos de alimentos contra a fome e o desperdício. Criada em 1994, a iniciativa do Sistema CNC-Sesc-Senac está presente em todos os estados do país, é formada por mais de 3,7 mil parceiros doadores e diariamente leva comida de onde sobra para quem mais precisa.
O programa de segurança alimentar e nutricional bateu recorde de arrecadação em 2021 e 2022, com 52 milhões de quilos de alimentos doados em cada ano. É comida que chegou à mesa de mais de 3 milhões de pessoas em todo o país. Graças a parceiros espalhados por todo o país, como produtores rurais, atacadistas e varejistas, centrais de distribuição e abastecimento, indústrias de alimentos, além de empresas de diversos ramos de atividade, é possível fazer isso.
Segundo dados da ONU, somente o Brasil desperdiça cerca de 27 milhões de toneladas de alimentos por ano. Quem mais perde são as famílias menos abastadas e que poderiam ampliar seu acesso a uma alimentação com alto valor nutricional, mas que, pela cultura do desperdício, acaba indo para o lixo. Este desperdício em geral é de produtos próprios para o consumo, que se perdem no manuseio, no transporte, ou simplesmente estão fora dos padrões estéticos para a venda nos mercados. Nós, como sociedade, precisamos atuar e fazer diferente.
O Mesa Brasil Sesc não deixa esses produtos se perderem e os recolhe diariamente por meio de uma frota que percorre todo o país e une os mais de 3 mil parceiros que doam seus excedentes de produção a 7.300 entidades. Essas, por sua vez, assistem milhares de pessoas em situação de vulnerabilidade com refeições. São instituições de longa permanência de crianças e idosos, creches comunitárias, instituições de acolhimento a idosos, crianças, adultos, dependentes químicos, pessoas em situação de rua e outros públicos necessitados de atenção. O Mesa Brasil Sesc conseguiu atender, em 2021, uma média mensal de 3,1 milhões de pessoas em 579 cidades ao redor do país. Foram mais de 3 mil ações educativas nas áreas de Nutrição e Serviço Social, com cerca de 77,7 mil participantes. Um trabalho de assistência e educação fundamentais, promovido pelos empresários do comércio de bens, serviços e turismo em nosso país.
Os alimentos recolhidos pelo programa são acondicionados conforme suas necessidades de conservação, em seguida são separados e disponibilizados para retirada pelas entidades sociais. A seleção, o transporte e a armazenagem dos produtos seguem importantes normas de controle higiênico-sanitárias. É feita a ponte entre quem pode contribuir com quem mais precisa.
Todo o trabalho do Mesa Brasil Sesc vai além de matar a fome. Levamos diariamente, junto com os alimentos, a dignidade e a cidadania que estas pessoas merecem. Pois alimentação é um direito social previsto pela Constituição e deve estar ao alcance de todos.