Roberto Romano – Filósofo e professor
Titular de Ética e Política na Unicamp
29 de Setembro de 2006 – O Brasil não gerou uma política ampla de educação científica, técnica e humanística para as grandes massas. Resulta que nossa mão-de-obra não tem formação básica e sua qualidade é pior do que a existente em muitos países não plenamente desenvolvidos. A seguir a ausência de preocupações oficiais e privadas em semelhante campo, não teremos saídas para o futuro.
Roberto Romano – Filósofo e professor
Titular de Ética e Política na Unicamp
29 de Setembro de 2006 – O Brasil não gerou uma política ampla de educação científica, técnica e humanística para as grandes massas. Resulta que nossa mão-de-obra não tem formação básica e sua qualidade é pior do que a existente em muitos países não plenamente desenvolvidos. A seguir a ausência de preocupações oficiais e privadas em semelhante campo, não teremos saídas para o futuro. Entre nós as políticas de produção industrial permanecerão inviáveis, dadas as privações no campo dos procedimentos e métodos tecnológicos adequados para o uso efetivo de saberes práticos. País que não ostenta abundante mão- de-obra qualificada em todos os sentidos, já perdeu a corrida pelos mercados mundiais. Somando-se a semelhantes pontos todos os outros obstáculos ao crescimento produtivo compatível com a tecnologia avançada, pode-se imaginar o melancólico futuro da sociedade brasileira. Por exemplo o governo prometeu que em 2006 o Brasil investiria 4% do PIB em ciência e técnicas, mas ainda não foi amplamente ultrapassado o índice que fica abaixo dos 2% do mesmo PIB. As aplicações em inovação tecnológica resumem-se praticamente aos fundos da Fapesp, no Estado de São Paulo, instituição pioneira e corajosa sem igual no País. Os índices de aprovação dos cursos de Matemática do ensino secundário brasileiro são os mais baixos da história recente. Enfim, tudo conspira para que a juventude não tenha a educação requerida por um Estado nacional que deve sustentar, em breve, mais de 200 milhões de pessoas.
Na verdade, não é recente a falta de planos federais eficazes para a educação ampla das massas. Após os projetos positivistas, no início da República, os cuidados dos governos e dos educadores voltaram-se mais para o ensino das carreiras superiores, tendo em vista elites beletristas ou científicas, mas sempre limitadas ao suposto happy few da classe média ou mais abastada.
A última iniciativa de abrangência nacional em favor da educação técnica e humanística das massas brasileiras encontra-se na instauração do chamado sistema S, com a labuta de Roberto Simonsen e de João Daudt de Oliveira. Assim nasceram institutos como o Sesi, Senai (1945) e Senac, Sesc em 1946. Desde então milhares e milhares de pessoas foram formadas, de modo estritamente técnico e também de maneira mais ampla, em plano humanístico, pelos mencionados institutos. Os ganhos para o País, em termos econômicos e sociais, foram incalculáveis. Pode-se dizer que, sem o trabalho do referido sistema, o Brasil estaria hoje em situação mais do que lamentável no cenário internacional.
Dentre todas as instituições referidas acima, o Sesc sempre se destacou como um elo fundamental na educação da juventude trabalhadora nacional. Ele uniu com prudência atividades educativas, de lazer, de serviço social e de cultura com tamanha eficácia que a simples presença de suas instalações em cidades do interior traz esperanças de melhoria na qualidade de vida de toda a coletividade. Se existe imposto cuja aplicação é benéfica ao País, o destinado ao Sesc é exemplar. Cada centavo nele aplicado beneficia imensos setores da população e reverte para a melhoria do padrão cultural e profissional do País.
Em várias ocasiões o Sesc foi ameaçado com perda de recursos. Em todas elas conseguiu, graças ao juízo lúcido do Judiciário, reverter as expectativas perigosas. Agora, com a votação do Super Simples – medida que altera os encargos tributários das pequenas empresas, com aspectos muito positivos – é preciso alertar os legisladores para um dos artigos do projeto, que coloca em risco a existência do Sesc ao suspender a contribuição que garante a atuação da entidade. Em 60 anos de existência, o Sesc (e seus congêneres) cumpriu o papel de formar, em sentido elevado, uma grande quantidade de pessoas sem as quais o País não ostentaria o potencial que o determina. Atenuar ou extrair o poder formador do mesmo Sesc significa arrancar um elemento substancial do nosso futuro como país. Cabe aos lúcidos senadores da República corrigir aquele artigo do projeto de lei, pensando na importância de um trabalho sério e competente que sempre trouxe bons frutos para todas as empresas brasileiras, grandes ou pequenas. (Gazeta Mercantil, 29 de setembro de 2006)