Desafios inadiáveis para 2007-2010

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Na avaliação de Aloísio Campelo, do Instituo Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), o próximo governo terá de perseverar na política macroeconômica, dedicando atenção especial à reforma fiscal. “Antes de mais nada, é necessário realizar reavaliação e contenção das despesas públicas, o que evitaria novos aumentos da carga tributária. Estamos com uma carga quase igual à dos países escandinavos, mas com serviços bem diferentes sendo prestados à população”, critica ele.


Campelo defende também nova reforma da previdência, “que se não for feita já, terá reflexos seríssimos no futuro”.

Na avaliação de Aloísio Campelo, do Instituo Brasileiro de Economia (Ibre/FGV), o próximo governo terá de perseverar na política macroeconômica, dedicando atenção especial à reforma fiscal. “Antes de mais nada, é necessário realizar reavaliação e contenção das despesas públicas, o que evitaria novos aumentos da carga tributária. Estamos com uma carga quase igual à dos países escandinavos, mas com serviços bem diferentes sendo prestados à população”, critica ele.


Campelo defende também nova reforma da previdência, “que se não for feita já, terá reflexos seríssimos no futuro”. Ele alerta ainda para a necessidade esforço na redução da informalidade. “Os números só crescem. Este é um problema que já vem sendo alertado até mesmo por organismos internacionais. A informalidade não é boa para nenhuma economia”, explica.


Outra questão citada pelo economista é a autonomia do Banco Central. “O país precisa disso. Não podemos deixar que o BC mude o rumo da política macroeconômica por conta de um aventureiro, por exemplo. Experiências internacionais mostram que não houve qualquer problema relacionado a crescimento em países onde o banco central é independente. Pelo contrário, este fator traz mais confiança aos investidores, que associam a autonomia a uma maior estabilidade”, diz Campelo.


Ainda em relação à estabilidade, Aloísio Campelo cita a importância do renascimento das agências reguladoras, que segundo afirma ficaram esquecidas durante o último governo. “Elas oferecem a garantia da manutenção das regras, nada mais importante para um investidor do que regras claras sendo cumpridas”, analisa o economista, acrescentando que o volume de investimentos é justamente um dos pontos-chaves para o desenvolvimento do Brasil.


Já o ex-diretor do Banco Central, Carlos Thadeu de Freitas, evoca a criação de uma agenda de desenvolvimento. Para ele, o país já conseguiu superar a fase do controle da inflação e agora precisa determinar caminhos para o crescimento. “O IPCA (inflação medida pelo IBGE) ficará bem abaixo da meta este ano e também deverá se manter dentro da meta no ano que vem. Com isto, o BC ganhará mais espaço para reduzir a taxa de juros, mas só isso não basta”, argumenta. A exemplo de Campelo, Freitas também cita a reforma tributária como ponto central para o desenvolvimento. Ele defende a desoneração do setor produtivo, que poderia utilizar os recursos hoje destinados ao pagamento de impostos, para novos investimentos. “A desoneração é o caminho mais rápido. Uma discussão sobre impostos com estados e municípios pode levar anos e o país não pode esperar por isto. O que é preciso entender é que, num primeiro momento, a arrecadação pode cair, mas ela pode ser retomada com novos investimentos”, explica.


Reavaliação qualitativa dos gastos do Governo


Quanto aos gastos do governo, o ex-diretor do BC defende uma reavaliação qualitativa. Freitas defende, por exemplo, que o reajuste do salário mínimo e do funcionalismo público acompanhe o IPCA. “É possível fazer isto e permitiria a manutenção do poder de compra”, calcula. O economista acrescenta que, com os juros menores, o juro real (taxa Selic descontada da inflação) a ser pago pelo governo será menor do que o deste ano, facilitando a formação do superávit. Para o cientista político Ricardo Ismael, do Departamento de Sociologia e Política da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), os escândalos do mensalão e da máfia dos sanguessugas revelaram a necessidade de nova forma de relacionamento entre o Executivo e o Congresso Nacional. Segundo afirma, o desafio do próximo governo será negociar com deputados e senadores sem lançar mão de instrumentos como distribuição de cargos comissionados e emendas orçamentarias. “Existem mais de 20 mil cargos comissionados no governo, um verdadeiro balcão de negócios. Esse padrão de relacionamento precisa mudar.


Ele está atrasado e atende apenas às antigas oligarquias. Formar uma base no Congresso é importante e válida para o governo, mas não pode ir de encontro aos fundamentos republicanos”, diz Ismael, afirmando que o governo poderia dar um sinal claro de sua intenção reduzindo o número de ministérios e de medidas provisórias (MPs). Para o cientista político, o próximo governo precisará promover mudanças com o voto distrital puro ou misto, a fidelidade partidária, o financiamento público de campanha e a questão da reeleição. Ele acrescenta que o governo precisará ainda sentar com a oposição e discutir a reforma política, com uma agenda minimalista. “Não adianta querer mudar tudo de uma vez, mas essas pautas precisarão ser prioritárias no próximo governo. São muitos os desafios, que demandarão grande articulação”, diz Ismael. O déficit de infra-estrutura de transportes está entre os principais gargalos da economia brasileira, afetando diretamente o desempenho da balança comercial e a competitividade dos produtos nacionais. Estradas esburacadas, ferrovias de extensão restrita e portos com grandes filas são gargalos que precisam ser atacados pelo próximo governo, sob o risco de limitar o crescimento da economia a percentuais inferiores a 4% ao ano. Estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que o desafio do próximo governo envolve a execução de gastos anuais de R$ 9,2 bilhões em infra-estrutura de transportes, investimento que precisaria ser mantido pelos governos subseqüentes por um período de 20 anos. O especialista em logística Maurício Lima, pesquisador da Coppead, explica que o próximo presidente precisará incentivar também o setor privado a aplicar em infra-estrutura. Um dos caminhos seria a Parceria Público-Privada (PPP). “A infra-estrutura será um grande desafio. Sem investimento, consideramos impossível um crescimento superior a 3% ao ano durante três a quatro anos consecutivos. As perspectivas de execução desses gastos, pelo cenário atual, são muito pequenas. O Governo precisa, portanto, recuperar sua capacidade de investimento para aplicar na expansão da malha ferroviária, na recuperarção de estradas e em melhores acessos aos portos. É preciso investir muito mais do que em operação tapa-buraco”, afirma o especialista.


Custo logístico é estimado em R$ 225,6 bilhões ao ano


Os investimentos permitiriam ao Brasil reduzir seu custo logístico, estimado em R$ 225,6 bilhões ao ano. O valor refere-se aos gastos com transporte doméstico, estoque, armazenagem e custos administrativos, representando 12,8% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Nos Estados Unidos, a relação entre o custo logístico e o PIB não ultrapassa os 5%. Esse custo elevado resulta, por exemplo, de uma malha rodoviária em que 60 mil quilômetros estão em estado regular, ruim ou péssimo.


O Brasil tem um grande desafio nos próximos anos na área de geração de energia, setor em constante crise desde o racionamento em 2001. O próximo governo precisará resolver questões ambientais que envolvem a expansão do parque hidráulico e também encontrar formas de garantir o abastecimento interno de gás natural, fonte necessária para a geração em termelétricas. Precisará ainda estimular a diversificação da matriz energética, incentivando fontes alternativas como biomassa. Para o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Adílson de Oliveira, o próximo governo também precisará rever a carga tributária incidente sobre o setor. “O preço da energia consumida no Brasil não é competitivo por conta da tributação em cascata. É preciso reformá-la para que o país possa usufruir do baixo custo da geração”, explica Oliveira, que lançou recentemente pesquisa em que prevê risco de racionamento de energia a partir de 2009. O professor acrescenta que o próximo governo precisará criar ambiente regulatório mais claro para incentivar principalmente o mercado de gás natural, modalidade que aponta como a de maior potencial de crescimento na matriz energética. “O governo também precisará se posicionar sobre a energia nuclear. Acredito que ela precisa ser expandida muito além da construção da usina Angra 3. Ela será necessária com o esgotamento de outras fontes geradoras”, conclui Oliveira.


BNDES: investimento produtivo deverá voltar a crescer na casa dos dois dígitos

O investimento produtivo das empresas na construção de fábricas e ampliação da capacidade de produção das já existentes deve voltar a crescer na casa de dois dígitos ao ano de 2007 a 2010, o que não se via há duas décadas. A maior parte dos recursos será voltada para os setores de bens intermediários e de commodities, como petróleo, mineração, siderurgia, celulose e petroquímica. Este é o resultado preliminar de levantamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que será concluído em novembro. A pesquisa foi solicitada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, quando presidia o BNDES.


O baixo nível de investimento na economia brasileira, que no segundo trimestre deste ano correspondeu 20,1% do Produto Interno Bruto (PIB), é hoje uma das principais travas ao crescimento e o grande desafio para o próximo governo.


Para chegar a conclusão de que o ritmo de investimento na economia vai ganhar fôlego nos próximos anos, os técnicos do BNDES reuniram dados sobre os pedidos de financiamentos das empresas, os desembolsos da carteira de crédito do próprio banco e consultas realizadas a entidades setoriais e às próprias empresas. O escopo dos dados corresponde a cerca de 25% do investimento (Formação Bruta de Capital Fixo) da indústria de base e de infra-estrutura, observa o superintendente da Secretaria de Assuntos Econômicos do BNDES, Ernani Teixeira Torres Filho.


“Os resultados são muito auspiciosos, na casa de dois dígitos ao ano na taxa de crescimento. Isso indica que o investimento nos próximos quatro anos terá uma aceleração substancial”, diz Torres Filho, sem revelar números. Entre 1982 e 2002, o investimento praticamente não cresceu. A taxa foi de 0,08% ao ano, observa o economista. A taxa anual de dois dígitos de crescimento foi obtida a partir de uma comparação feita entre o volume total de investimentos programados pelas empresas entre 2007 e 2010 em relação ao período 2002 e 2005.


Torres Filho destaca que os investimentos para os próximos quatro anos estão concentrados no setor de commodities e bens intermediários. “Os investimentos em petróleo, gás, mineração, siderurgia, celulose e petroquímica vão explodir”, prevê com base nos dados coletados. São setores intensivos em capital, cujas plantas de produção são enormes e consomem dezenas de milhões de dólares para serem erguidas.


O economista ressalta que fatores determinantes para impulsionar um grande pacote de investimentos voltados à produção de commodities e bens intermediários são setoriais. No caso da siderurgia e da celulose, por exemplo, está ocorrendo uma migração das fábricas do Hemisfério Norte para o Hemisfério Sul, onde as vantagens competitivas são maiores.


Nem mesmo um ciclo de queda dos preços das commodities metálicas e agrícolas que começa a se desenhar no mercado internacional, como já mostram as previsões do Fundo Monetário Internacional (FMI), e o enfraquecimento da demanda desses produtos por parte da China, devem alterar as previsões de investimentos das empresas para esses setores. “O investimento hoje segue uma lógica determinante mais estrutural”, observa o economista.


Levantamento feito pela empresa de consultoria Deloitte confirma essa tendência. A maior fatia dos investimentos produtivos anunciados entre o fim do ano passado e o primeiro semestre deste ano e programados para o biênio 2006/2007 está direcionada para a produção de commodities e bens intermediários, diz o gerente de Corporate Finance da Deloitte e responsável pela pesquisa, Reinaldo Grasson.


De janeiro a junho, a soma dos investimentos anunciados para commodities e bens intermediários, como agropecuária, petróleo e gás, mineração, produtos químicos e petroquímicos, siderurgia e metalurgia, somaram US$ 7,924 bilhões – o que significa 30% dos investimentos totais anunciados no período. O levantamento mostra que os investimentos direcionados para commodities e bens intermediários supera os voltados para energia elétrica, gás e saneamento (25,8%)e o da indústria de transformação (21,5%).


“No caso das empresas voltadas principalmente para o mercado interno, os investimentos estão em compasso de espera, aguardando sinais mais claros de retomada do ritmo de atividade”, diz Grasson. Entre esses sinais mais favoráveis à economia local, ele aponta a taxa de juros, aumento da renda, volumes de crédito e câmbio.


O setor de máquinas, um dos termômetros do investimento, mostra que a disposição das empresas para investir, em geral, está baixo. Até agosto, o faturamento do setor caiu 4% em relação a 2005, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). Newton de Mello, presidente da entidade, diz que o desempenho dos 27 setores no ano é heterogêneo. No caso das máquinas agrícolas, a queda foi de 8%. Já o setor de válvulas, que tem como cliente a Petrobras, e o de mineração, que fornece para Vale do Rio Doce, ampliaram o faturamento em 28% e 15%, respectivamente.

Infra-estrutura precisa de R$ 87,7 bi por ano Renée Pereira


Os investimentos no setor de infra-estrutura também devem ganhar impulso nos próximos anos, especialmente se a taxa básica de juros (Selic) continuar com tendência decrescente. Especialistas alertam, no entanto, que a expansão dos projetos exigirá melhor ambiente de negócios, com estabilidade de regras, segurança jurídica e redução da burocracia. Segundo estudo da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), a necessidade de investimento do setor é R$ 87,7 bilhões por ano de 2007 e 2010 – 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB).


O número faz parte de uma agenda positiva para a infra-estrutura e foi entregue aos candidatos aos cargos dos poderes Executivo e Legislativo. De acordo com a agenda, os investimentos públicos e privados em energia elétrica devem somar R$ 16,6 bilhões por ano; petróleo e gás natural, R$ 31,5 bilhões; transportes, R$ 16,8 bilhões; telecomunicações, R$ 13,2 bilhões; e saneamento básico, R$ 9,6 bilhões.


Na área de geração de energia elétrica, por exemplo, os empreendimentos têm esbarrado na demora para a obtenção de licenciamento ambiental. Várias usinas estão em locais mais sensíveis, próximos de áreas de preservação ambiental. No setor de transportes, um dos primeiros passos será liberar o leilão de concessão de estradas federais. São oito trechos de estradas importantes, como a Fernão Dias (BR-381), que liga São Paulo a Belo Horizonte, e a Régis Bittencourt (a BR-116), que liga São Paulo a Curitiba. Outros trechos a serem leiloados são BR-153, na divisa entre São Paulo e Minas Gerais até a divisa de São Paulo com o Paraná; BR-101, que vai da divisa do Estado do Rio com o Espírito Santo até a ponte Rio-Niterói; e a BR-116, entre Curitiba e a divisa de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul.


 

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