O ataque ao FGTS (Jornal do Commercio, 30/08/2006)

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Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo


O Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) foi uma genial criação do Governo do Presidente Castelo Branco, em 1966, por proposta dos saudosos Ministros Roberto Campos, Octávio Bulhões e Nascimento Silva. Integra, ao lado da Consolidação das Leis do Trabalho e da Previdência Social, a trinca das grandes conquistas dos trabalhadores brasileiros. O FGTS não foi imposto aos trabalhadores.

Antonio Oliveira Santos

Presidente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo


O Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) foi uma genial criação do Governo do Presidente Castelo Branco, em 1966, por proposta dos saudosos Ministros Roberto Campos, Octávio Bulhões e Nascimento Silva. Integra, ao lado da Consolidação das Leis do Trabalho e da Previdência Social, a trinca das grandes conquistas dos trabalhadores brasileiros. O FGTS não foi imposto aos trabalhadores. A estes foi facultada a adesão ao novo sistema, em troca da estabilidade no emprego, que havia se constituído num grande entrave ao desenvolvimento econômico e social do País, gerando o chamado “passivo trabalhista”, que inviabilizava a saúde financeira das empresas em geral e impedia os investimentos, sobretudo estrangeiros, geradores de emprego e renda.


A sistemática de contas bancárias vinculadas, hoje centralizadas na Caixa Econômica Federal, permite, a cada trabalhador, visualizar, à vista de extratos periódicos, a poupança acumulada, mês a mês, em seu nome, e originada pelos depósitos correspondentes a 8% da remuneração mensal, efetuados pelos respectivos empregadores. Os saldos das contas são monetariamente corrigidos de acordo com os índices aplicados às contas de poupança (“cadernetas”) e abonados de juros, capitalizados numa escala prefixada. O conjunto das contas é que forma o Fundo. Os trabalhadores têm direito de levantar os saldos dessas contas, no caso de rescisão sem justa causa, término do contrato a prazo determinado, aposentadoria ou para fins de aquisição da casa própria ou, ainda, outros fins estabelecidos na lei. A Lei nº 5.107, de 1966, foi substituída e aperfeiçoada, no Governo Sarney, pela Lei nº 7.839, de 1989, e, no Governo Collor, pela Lei nº 8.036, de 1990.


Desde a sua criação, o FGTS tem a garantia, expressa na lei, do Tesouro Nacional e os seus recursos são aplicados no financiamento da construção de imóveis residenciais, inicialmente por intermédio do antigo BNH. A Lei nº 7.839/89 permitiu que os recursos do Fundo fossem aplicados não só em habitação, mas também em saneamento básico e infra-estrutura urbana, consideradas necessárias para viabilizar a construção de conjuntos habitacionais. Nessas operações, são exigíveis correção monetária e juros suficientes para cobrir os custos do Fundo e a formação de reservas técnicas. Hoje, o FGTS é gerido pelo Governo Federal, segundo normas estabelecidas por um Conselho Curador integrado por representantes de órgãos do Governo, dos trabalhadores e dos empregadores, entre estes o da Confederação Nacional do Comércio.


A Lei nº 8.036/90, do Governo Collor, criou um encargo (chamado de “multa”), no valor de 40% do total dos depósitos efetuados durante a vigência do contrato de trabalho, em favor do trabalhador, no caso de despedida sem justa causa. Essa inovação, se, por um lado induz a permanência no emprego, por outro desestimula as novas contratações e restaura, de certa forma, o passivo trabalhista que o FGTS veio substituir. De qualquer forma, constitui-se hoje em direito incorporado ao patrimônio do trabalhador.


Com as modificações introduzidas pela Lei nº 7.839/89, os recursos do FGTS foram utilizados no financiamento de obras de infra-estrutura de numerosas Prefeituras, as quais, em sua grande maioria, não honraram as suas obrigações. Em dado momento, o Fundo tornou-se deficitário, isto é, se todos os trabalhadores pudessem levantar os seus depósitos, não haveria recursos suficientes e o Tesouro Nacional teria de honrar a garantia. No governo anterior e no atual, essa situação foi saneada e os créditos do Fundo foram trocados por Títulos do Tesouro Nacional, que, ultimamente, renderam expressivas somas.


Presentemente, o FGTS possui ativos de cerca de R$ 180 bilhões, compõe-se de cerca de 100 milhões de contas e continua sendo o grande funding para o financiamento de habitações populares, uma vez que, para o financiamento das habitações da classe média, funciona o Sistema de Financiamento Imobiliário, com recursos das contas de poupança. A administração e gestão do FGTS são ágeis e compactas e podem servir de modelo para a implementação dos Fundos de Previdência Social previstos nos arts. 249 e 250 da Constituição. Não foi necessário um Ministério, uma Secretaria ou uma agência para administrar o FGTS.


Por todas essas razões, afigura-se inoportuna e descabida a proposta do Ministério do Trabalho, no sentido de desviar recursos do FGTS, que constituem patrimônio dos trabalhadores, para financiar rodovias, ferrovias e portos, que podem ser atendidos pelo Orçamento, BNDES, Banco do Brasil ou mediante concessões, privatizações ou parcerias público-privadas. Aliás, o Governo, pela via do art. 239 da Constituição de 1988, já se apropriou de outro patrimônio dos trabalhadores, o Fundo PIS-PASEP, transformado em receita fiscal da Seguridade Social.


O FGTS necessita apenas de duas modificações: 1ª) creditar às contas vinculadas dos trabalhadores, proporcionalmente, o superávit de cerca de R$ 22 bilhões hoje existente, que, afinal, foi obtido com a aplicação dos depósitos a eles pertencentes, na forma da lei, e graças à boa administração do Conselho Gestor e da Caixa Econômica; e 2ª) revogar a contribuição social de 10% sobre o montante da conta vinculada do trabalhador, no caso de despedida sem justa causa, criada pela Lei Complementar nº 110, de 29/6/01, em verdade para cobrir a despesa com o pagamento da correção relativa ao expurgo de índices de inflação dos Planos Econômicos. A chamada multa de 40%, criada pela Lei nº 8.036/90, já é bastante pesada para o empregador.


Enfim, esta proposta não pode prosperar, sobretudo num Governo de forte inclinação social, como o do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e em pleno processo eleitoral.


Publicado no Jornal do Commercio, de 30/08/2006.

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